HISTÓRIA

Maria dos Santos Messias, Edmir e Silvino Antonio
de Messias.
MESSIANISMO
EM MARIA PEREIRA
Segundo
o Novo Dicionário Aurélio, messianismo
é qualquer movimento político-religioso baseado na crença
em um enviado divino (já presente ou ainda por vir) que anuncia
e prepara a abolição das condições vigentes,
e por fim instaura, ou reinstaura, uma era de plena felicidade e justiça.
[Aplica-se o termo esp. quando tal crença pode ser considerada
uma referência ideológica para grupos e povos em situação
de crise e de dominação, p. ex. em contexto de domínio
colonial. Cf. milenarismo, profetismo.].
No Brasil, entre a
segunda metade do século XIX e o segundo quartel do século
XX ocorreram vários movimentos messiânicos-milenaristas,
entre os quais citamos, pela ordem cronológica: Movimento
Mucker de Jacobina Maurer e João Carlos Maurer (1866-1874);
Juazeiro do Padre Cícero (1872-1934); Canudos
de Antonio Conselheiro (1893-1897); Contestado dos monges
João Maria e José Maria (1912-1916) e Caldeirão
do beato José Lourenço (1932-1937).
Por volta do ano de
1932, o alagoano Silvino Antonio de Messias, acompanhado
da sua esposa Maria dos Santos Messias e do seu filho
Edmir, chegou a Fortaleza, proveniente do Estado
de Alagoas. Silvino que era barbeiro profissional exerceu a profissão
na capital cearense e anos depois viajou para o interior. Depois de percorrer
várias cidades, passou a residir no sítio São
Mateus, no sopé da serra dos Marroás,
em Maria Pereira, há aproximadamente 40 quilômetros da sede
do município, a partir de setembro ou outubro de 1936, onde começou
a organizar a sua seita, em cujas orações eram invocados
os nomes de São Francisco de Canindé e do Padre Cícero.
O proprietário
das terras, um coronel muito religioso e porque visse Silvino andar às
voltas diariamente com rezas e cruzes, imaginando que se tratasse de um
devoto, não lhe negou as suas terras para a realização
dos cultos. Silvino começou o seu novo modo de vida em Maria Pereira
preparando garrafadas e fazendo “curas”, vindo daí
a crendice de que ele era um ente sobrenatural e digno de receber obediência.
Mais tarde, o beato,
que era tratado por mestre Silvino ou Paisinho,
começou a arregimentar pessoas para o seu credo. Fardou a todos,
homens e mulheres, e de cada fanático cobrava uma quota, de que
se sustentava, passando assim a viver despreocupadamente. Os homens usavam
fardas semelhantes à dos congos¹ e divisas que estabeleciam
a hierarquia “militar” da seita.
O mestre Silvino foi
chamado à delegacia de polícia de Maria Pereira porque uma
mulher veio a falecer em consequência da ingestão de
uma garrafada receitada pelo mesmo. Ao invés de se apresentar diretamente
ao delegado, um sargento da Polícia Militar, o beato preferiu mandar
três “ordenanças” em seu lugar. Os três
“tenentes”, fardados e montados, comunicaram ao delegado que
o beato assim o fazia porque tinha mandado prender a pessoa que supunha
ser o seu denunciante e a mesma se recusara a obedecer-lhe. Assim sendo,
também não se achava com o direito de acatar as ordens do
delegado.
Sabendo que o núcleo
de fanáticos estava progredindo, o delegado de Maria Pereira, seguiu
à paisana até o sítio São Mateus, a fim de
observar a vida de mestre Silvino e de seus adeptos. Ali chegando, sob
a justificativa de que desejava comprar um sítio, o sargento hospedou-se
na casa de mestre Silvino e conseguiu devassar, de alguma forma, as particularidades
do núcleo que era composto por aproximadamente cem homens, todos
ostentando fardas coloridas e cruzes de madeira de cerca de oitenta centímetros,
as suas únicas armas.
O líder da seita,
um caboclo de cinqüenta anos de idade presumíveis, conquistara
facilmente os roceiros que o rodeavam, de maneira a ser cegamente obedecido
e acreditado.
Nas proximidades da
residência de mestre Silvino foi edificada uma capela e no alto
da serra do Coité levantaram um enorme cruzeiro,
aonde os romeiros seguiam em procissões, conduzidos pelo beato.
Existia também um subterrâneo, cuja origem e objetivos não
foram explicados ao delegado de Maria Pereira.
Algumas das mulheres
pertencentes ao núcleo, conhecidas como “as virgens”,
costumavam dar ataques histéricos, ficando estendidas no chão
como mortas. Só se levantavam e retornavam à vida aos acenos
de mestre Silvino, que assim procurava passar como um ente sobrenatural,
tocado pela inspiração divina. Essas “virgens”
carregavam grandes cruzes e uma delas se apresentou ao delegado sobraçando
uma cruz de aproximadamente dois metros de altura.
No dia 13 de maio de
1937, o delegado de Maria Pereira, com certa habilidade, tendo acesso
ao culto e depois de se ausentarem todos os “tenentes” de
mestre Silvino, efetuou a sua prisão. Ao contrário do “Caldeirão”,
os fanáticos de Maria Pereira eram cearenses na sua unanimidade,
com exceção do beato e de sua esposa que eram alagoanos.
O chefe de Polícia
do Estado do Ceará, capitão Cordeiro Neto²
(1901-1992), tendo conhecimento do novo “Caldeirão”,
viajou no dia 18 de maio para Maria Pereira em um dos aviões militares
postos à disposição das autoridades estaduais, retornando
à capital cearense na madrugada do dia 19 de maio, conduzindo o
beato Silvino, a sua esposa Maria dos Santos Messias e o seu filho Edmir.
Assim falou o capitão
Cordeiro Neto ao jornal O POVO:
- Está completamente
extinto o antro de Maria Pereira, que estava localizado no sopé
da serra dos Marroás e a sete léguas da cidade. Como se
vê, era um caso destituído de grande significação
e que não se podia comparar com o do Caldeirão.
- Tendo conhecimento
do fato por intermédio do delegado local, enviei uma diligência,
que procedeu a uma batida, e ontem cheguei àquele município.
O acesso ao núcleo de Silvino é feito com sacrifício.
- Quando cheguei lá,
já o delegado estava com o beato no xadrez. Minha preocupação,
portanto, foi apenas dar baixa nos tenentes e tratar
de convencê-los de que aquilo não passava de uma pantomina
e grossa exploração por parte de Silvino.
Indagado sobre qual
a providência a ser tomada, o chefe de Polícia declarou:
- Silvino Antonio poderia
ser processado pelo fato de estar exercendo a falsa medicina. Mas disso
não resultará benefício nenhum para a sociedade.
Por isso, irei mandá-lo deixar em Alagoas, sua terra. É
mais prático. Quanto ao restante do pessoal, posso assegurar que
não mais repetirão as cenas presididas pelo seu chefe –
concluiu o capitão Cordeiro Neto.
Àquela época
administrava o município de Maria Pereira, o prefeito Carlos
Augusto Castelo Benevides³ (1902-1969), que havia
assumido o exercício do cargo em 18 de agosto de 1936 após
a renúncia de Augusto Tavares de Sá e Benevides,
que permaneceu à frente da prefeitura durante dois meses. No dia
2 de maio de 1937, há poucos dias da prisão do beato Silvino,
o prefeito Carlos Benevides inaugurara a luz elétrica daquele município.
A usina que servia a luz elétrica era provida de um motor de 24
HP e de um dínamo “Azea” de 18 KVA. A direção
dos trabalhos de instalação esteve a cargo do mecânico
Sr. Pedro Carneiro Luck, o qual, a convite do prefeito,
iria dirigir a usina.
(Fontes: O messianismo no Brasil e no mundo, de Maria Isaura Pereira
de Queiroz; Jornal O POVO, nº. 3516, de 19 de maio de 1937, quarta-feira;
Jornal O POVO, nº. 3517, de 20 de maio de 1937, quinta-feira).
1. Congos - [Do top. Congo (África).]
Substantivo masculino. 1.V. congolês
(3). 2.V. banto (3). 3.Designação genérica de escravo
banto dos antigos reinos do Congo e do Cacongo. 4.Gloss.
V. congolês (5). 5.Bras. Rel. Indivíduo
que pertence a um candomblé congo. 6.Bras.
N. N.E. Etnogr. Dança dramática de origem africana,
que se realiza de preferência pelo Natal, pela festa de Nossa Senhora
do Rosário, e pela de São Benedito. Adjetivo.
7.Bras. Rel. Diz-se do rito e do panteão
(2) de alguns candomblés bantos. 8.V. congolês (1).
2. Cordeiro Neto – Manuel Cordeiro Neto. Um dos
mais louváveis chefes de Polícia e secretário de
Polícia e Segurança Pública que já teve o
Ceará, nasceu no dia 31 de dezembro de 1901, em São Bernardo
de Russas, que o decreto-lei nº. 448, de 20 de dezembro de 1938,
denominou simplesmente Russas. Era filho de João Lopes de Sousa
Lima e Maria Cordeiro Lopes. Por decreto nº. 14, de 21 de fevereiro
de 1959, foi promovido ao posto de general-de-brigada e transferido para
a reserva remunerada com proventos correspondentes ao posto de general-de-divisão.
Exerceu ainda os cargos de presidente do Aeroclube do Ceará (1941);
de diretor-administrativo da Companhia Elétrica do Ceará
(COELCE); de prefeito municipal de Fortaleza (1959-1963) e secretário
de Administração (1971-1975). Contraiu núpcias pela
primeira vez com a Sra. Maria Adelzira Holanda Cordeiro, de cujo consórcio
nasceram Maria Arisleda e Maria Arineida, e com D. Eleonora Maria Cordeiro
pela 2ª vez. Faleceu no dia 22 de outubro de 1992, aos 90 anos de
idade, vítima de isquemia cerebral, na Casa de Saúde São
Raimundo, encontrando-se sepultado no Cemitério São João
Batista de Fortaleza. (MELO, Clemilton da Silva. Secretários
de Segurança Pública do Ceará: 1937-2006.
Fortaleza: ABC Editora, 2006.)
3. Carlos Augusto Castelo Benevides - Nasceu em Mombaça-Ce,
a 24 de dezembro de 1902 e faleceu em Fortaleza-Ce, a 13 de dezembro de
1969, há 11 dias de completar 67 anos de idade, onde foi sepultado.
Era o 1º filho de Augusto Lopes de Sá Benevides e de Júlia
Castelo Benevides. Pertenceu a tradicional família de políticos
mombacenses. Seu pai foi presidente da 16ª Câmara Municipal
de Mombaça (1916/1920) e o seu avô paterno, Silvino Lopes
de Sá Benevides, foi prefeito municipal de Mombaça (1916/1919).
Fazendeiro e comerciante, foi prefeito municipal de Mombaça, nos
períodos de 1934 a 1935, de 1936 a 1937, de 1945 a 1947 e de 1948
a 1951. Durante as suas gestões melhorou o fornecimento de energia,
construiu estradas para os distritos e povoados e criou escolas, entre
outras realizações. Casou-se com a Sra. Beatriz Alencar
Castelo Benevides, a 26 de dezembro de 1925, com quem teve 12 filhos.
Música-tema
da página: Odeon, de Ernesto
Júlio Nazareth (1863-1934), pianista e compositor
brasileiro, considerado um dos grandes nomes do "tango brasileiro"
ou, simplesmente, choro.
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