ENFOQUE
A IMBECILIDADE BARULHENTA E A LEI DE CONTRAVENÇÕES PENAIS
Raugir Lima Cruz*
Existe
o pensamento utópico que chegará o dia que homem alcançará
tal estágio de evolução que não necessitará
mais do direito penal. Olhando para países escandinavos como Suécia,
Noruega é até possível vislumbrarmos o futuro em
que o homem prescindirá das leis penais. Entretanto, quase impossível
imaginarmos o Brasil em tal situação.
A Lei de Contravenções
Penais (Decreto-Lei 3.688/41) prevê infrações penais
consideradas de menor gravidade em relação aos crimes previstos
no Código Penal e legislações extravagantes. Por
isso, e porque tal lei traz em seu bojo infrações de perigo
abstrato, alguns defendem a sua inconstitucionalidade, felizmente assim
não é o entendimento do Supremo Tribunal Federal.
Agora imagine só,
por exemplo, o que seria de todos nós e do nosso sossego sem a
figura prevista no artigo 42 da Lei de Contravenções Penais,
que passo a descrever: “Perturbar alguém, o trabalho
ou o sossego alheios: I – com gritaria ou algazarra; II –
exercendo profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com
as prescrições legais; III – abusando de instrumentos
sonoros ou sinais acústicos; IV - provocando ou não procurando
impedir barulho produzido por animal de que tem guarda: Pena – prisão
simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, ou multa.”
Dá para observar,
primeiro que a Lei protege o “sossego” que vai muito além
de “repouso ou descanso”, de forma que pode haver perturbação
do sossego a qualquer hora do dia ou da noite, e, segundo, essa perturbação
pode ser ocasionada por gritaria (voz humana) algazarra (outro forma de
barulho), por profissão que cause barulho em decibéis acima
de suportável, analisando-se regulamentos ou licenças municipais,
como também por animais de que se tenha guarda, quando o animal
é provocado a fazer barulho ou quando nada se faz para impedir
o barulho.
Por último,
propositalmente, analisamos o inciso III – “abusando de
instrumentos sonoros ou sinais acústicos”. É
aqui que nos deparamos, muitas vezes, com a falta de civilização
de vizinhos desrespeitosos, abusando de seus aparelhos sonoros, como também
da imbecilidade de proprietários de veículos com seus paredões
de som.
Para
que se vislumbre a dimensão da proteção do sossego,
até mesmo cultos religiosos que abusem de sonorização,
pode configurar perturbação do sossego alheio. Em que pese
a liberdade religiosa e o livre exercício do culto, do outro lado
estará a paz e o sossego das pessoas, merecedores também
de devida proteção.
Após
essa resumida análise, basta olharmos através de nossas
janelas, para vermos desrespeito e indiferença com os semelhantes,
e assim muito distante de uma evolução humana capaz de abrir
mão do direito penal como um todo ou até mesmo da Lei de
Contravenções Penais. Uma Lei de 1941 e tão necessária
atualmente.
(Publicado
no jornal ,
Ano XXXIX, nº 159, Novembro/2014).
Untitled Document
*Raugir
Lima Cruz. Oficial de Justiça da Comarca de Quixelô-CE.
É mombacense de Senador Pompeu, Ceará, onde nasceu no
dia 15 de janeiro de 1966, filho de Etevaldo Lima Cruz e de Francisca
Zeneida Lima Cruz. Graduou-se em Pedagogia na Faculdade de Educação,
Ciências e Letras de Iguatu - FECLI. É bacharel em Direito
e pós-graduado em Direito Penal e Criminologia pela Universidade
Regional do Cariri - URCA. Obteve o 2º lugar no Concurso Literário
Rachel de Queiroz, promovido em 2006 pelo Fórum Clóvis
Beviláqua em comemoração aos 30 anos da sua biblioteca,
com a crônica .
A sua crônica foi publicada na coletânea “Sertão:
olhares e vivências” com os dez trabalhos classificados
no referido concurso. No dia 18 de dezembro de 2007 recebeu o título
de cidadão quixeloense concedido pela Câmara Municipal
de Quixelô. É autor dos artigos "Uma análise principiológica e legal das interceptações telefônicas: a produção probatória à luz do princípio da proibição da proteção deficiente", publicado na edição nº 87, ano XIV, abril/2011, da Revista Âmbito Jurídico e “A aplicação da Willful Blindness Doctrine na Lei 9.613/1998: A declaração livre e a vontade consciente do agente”, publicado no volume nº 9, edição 2011, da Themis, revista científica da Escola Superior da Magistratura do Estado do Ceará (ESMEC).
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